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18 de setembro de 2013 – ano I – nº 6. Boletim Científico Online
Cristina Gonçalves Alvim
Definições
Bronquiectasia é uma anormalidade estrutural caracterizada pela dilatação anormal e distorção da árvore brônquica, resultando em doença pulmonar obstrutiva crônica. Esta condição é normalmente o resultado final de uma variedade de processos fisiopatológicos que tornam as paredes brônquicas enfraquecidas, cronicamente inflamadas e com secreções mucosas. Achados associados incluem atelectasias, hiperinsuflação, fibrose e hipertrofia da vasculatura brônquica.
O sintoma mais comum é a tosse persistente, geralmente úmida, presente em 80 a 90% das crianças com bronquiectasia. Cinquenta e sete a 74% das crianças também produzem secreção purulenta. Crianças com idade inferior a seis ou sete anos de idade podem não ser capazes de expectorar.
Alguns pacientes apresentam exacerbações episódicas de infecção, caracterizada por aumento da tosse e produção de expectoração que pode ser associado com febre, dor pleurítica e dispneia, que respondem a antibioticoterapia. A hemoptise, causada por erosão de tecido das vias respiratórias inflamadas adjacente aos vasos pulmonares, é incomum em crianças, ocorrendo em 4 a 7%. Dispneia e intolerância ao exercício são incomuns na apresentação, mas podem desenvolver-se com o progresso da doença.
Causas da bronquiectasia
A bronquiectasia pode ser causada por uma variedade de doenças, a maioria dos quais incluem uma combinação de obstrução e infecção brônquicas. A etiologia da bronquiectasia varia entre populações e grupos etários. Infecções e causas adquiridas de bronquiectasia são mais comuns em adultos e em países em desenvolvimento, enquanto que as anomalias congênitas ou imunes são mais proeminentes nas crianças e nos países industrializados.
Quadro 1 – Principais causas de bronquiectasias em crianças
Nathan et al. (2013) estudaram a etiologia e a evolução da doença pulmonar supurativa crônica em crianças, na Malásia. Sessenta pacientes com bronquiectasias, com ou sem Fibrose Cística e Bronquiolite Obliterante foram incluídas. A mediana da idade no diagnóstico foi de 1,3 (0,2-11) anos. A etiologia foi identificada em 83% dos casos e 40% eram pós-infecciosa de origem. As crianças que eram aderentes ao tratamento tiveram melhora no Índice de Massa Corporal (IMC). A maioria, 78%, apresentavam com FEV1 inferior a 80% e 77% dos pais entrevistados tinham altos escores totais de ansiedade e depressão. Este estudo demonstra o impacto das bronquiectasias na vida da criança e a importância do diagnóstico precoce.
Abordagem propedêutica
Os objetivos da abordagem são confirmar o diagnóstico de bronquiectasia, avaliar a gravidade da doença pulmonar e identificar a etiologia subjacente.
A tomografia computadorizada de alta resolução (TCAR) é o método de imagem mais sensível para detectar bronquiectasia, e deve ser realizada quando a radiografia de tórax é normal ou não específica em um paciente com suspeita clínica de bronquiectasia. O diagnóstico é feito quando o diâmetro interno das vias respiratórias é maior do que o diâmetro da artéria adjacente ou são visualizados brônquios no espaço de 1 cm da superfície pleural.
Quadro 2 – Exames para avaliar a gravidade e acompanhar a evolução
Para avaliar a etiologia, recomenda-se a realização criteriosa de diversos exames, selecionados de acordo com a história clínica da criança (quadro 3).
Quadro 3 – Exames para investigar a etiologia
Tratamento
É importante avaliar também a existência de co-morbidades como asma, doença do refluxo gastroesofágico (DRGE) e bronquiolite obliterante (BO). Raramente a asma pode ser a causa da bronquiectasia, especialmente quando associada a síndrome do lobo médio (atelectasia persistente). É mais provável que a asma exista como associação, sem relação de causa ou consequência, e isso piora o prognóstico da bronquiectasia. O RGE pode estar associada a diversas pneumopatias crônicas, mas na maioria dos casos não necessita de tratamento específico. A BO apresenta diversas características comuns com as bronquiectasias: etiologia pós-infecciosa, manifestações clínicas e radiológicas.
O tratamento visa a prevenção da perda da função pulmonar. A abordagem deve ser interdisciplinar, com cuidado integral da saúde da criança (nutrição, crescimento, desenvolvimento, imunização).
A fisioterapia respiratória é recomendada diariamente. A drenagem postural é a terapia padrão, mas pode aumentar o RGE. A disponibilidade de várias técnicas para a limpeza das vias respiratórias e a falta de clara superioridade de uma sobre a outra exige que as escolhas sejam individualizadas. Todos os pacientes devem ser encorajados a praticar atividade física.
Em relação ao tratamento farmacológico, na maioria das vezes, baseia-se em evidências fracas, de estudos com poucos pacientes ou sem grupo controle, ou extrapolados de pesquisas em adultos e em Fibrose Cística.
Recente revisão da Biblioteca Cochrane concluiu que os estudos sobre o uso de antibióticos prolongados para bronquiectasia purulenta em crianças e adultos indicaram uma pequena melhora nos sintomas, mas não na função pulmonar ou nas taxas de exacerbações. Sendo assim, permanece a dúvida quanto ao melhor esquema terapêutico, com tendência a tratar as exacerbações e evitar o uso contínuo devido ao risco de desenvolvimento de resistência antimicrobiana.
Quanto aos pacientes infectados por Pseudomonas aeruginosa, Orriols et al (1999) observaram que a utilização de Ceftazidime e Tobramicina por via inalatória durante um ano esteve associada a redução do número e da duração das admissões hospitalares (grupo com ATB – 0,6 admissões e 13,1 dias de internação; grupo sem ATB – 2,5 admissões e 57,9 dias de internação; p <0,05).
O uso de mucolítico, rhDNAase, está contraindicado em bronquiectasia não-relacionada com a FC. Ensaio clínico randomizado, duplo-cego, multicêntrico, com 349 adultos com bronquiectasias, mostrou aumento nas exacerbação e taxas de internação (risco relativo de 1,35 e 1,85, respectivamente) e declínio da função pulmonar mais rápido (redução VEF1 de 3,6% no grupo rhDNase;. 1,6%, no grupo placebo).
A solução salina hipertônica parece melhorar a função pulmonar e reduzir a frequência de exacerbações em pessoas com doença pulmonar supurativa. O pré-tratamento com um broncodilatador de curta duração é recomendado. O manitol inalado é outro agente osmótico promissor.
Macrolídeos são antibióticos que possuem atividades anti-inflamatórias, e podem reduzir a hipersecreção de muco em adultos com bronquiectasia e crianças com fibrose cística. A evidência atual para a recomendação universal em bronquiectasias não fibrocísticas em crianças é insuficiente.
Anticolinérgicos como a atropina podem lentificar o transporte mucociliar e predispor a mais estase do muco. O Tiotroprium foi avaliado em um estudo em adultos, sem controle, com estados de hipersecreção resistentes aos macrolídeos (incluindo bronquiectasia) e reduziu os sintomas diários e melhorou a qualidade de vida, mas não é recomendado em crianças.
Sintomas de asma em crianças com bronquiectasia devem ser tratados por seu próprio mérito, ou seja, se existir asma associada. Em relação a medicações broncodilatadoras, quando apenas os estudos controlados com placebo foram analisados, não houve diferenças significativas entre os grupos em nenhum dos desfechos. Corticóides inalatórios têm pouco papel na abordagem da bronquiectasia em crianças quando a asma não co-existe.
As Indicações de cirurgia têm diminuído a medida que a prevenção, o diagnóstico precoce e a abordagem multidisciplinar se tornaram mais eficazes. O quadro 4 resume estas indicações.
Quadro 4 – Cirurgia em Bronquiectasias
Concluindo, a saúde não pode ser isolada das questões sociais, econômicas, ambientais e educacionais. O aumento da pobreza é um fator de risco independente para aumento de infecções respiratórias. A atenção a doenças crônicas, incluindo as bronquiectasias, pressupõe uma atenção primária abrangente e altamente qualificada visando a identificação precoce de crianças com risco. A atuação do especialista consiste em confirmar o diagnóstico, propor a abordagem propedêutica e terapêutica e abordar as complicações (Hemoptise e Cor pulmonale).
Referências bibliográficas
- Wilmott e cols. Kendig & Chernick’s Disorders of the Respiratory Tract in Children, 8th Edition. Elsevier, 2012
- Fakhoury, KA & Kanu A. Management of bronchiectasis in children without cystic fibrosis. www.uptodate.com, acesso em agosto de 2013.
- Fakhoury, KA & Kanu A. Clinical manifestations and evaluation of bronchiectasis in children. www.uptodate.com, acesso em agosto de 2013.
- Fakhoury, KA & Kanu A. Causes of bronchiectasis in children. www.uptodate.com, acesso em agosto de 2013.
- Orriols et al. Inhaled antibiotic therapy in non-cystic fibrosis patients with bronchiectasis and chronic bronchial infection by Pseudomonas aeruginosa. Respir Med. 1999; 93:476-480.
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