Dengue: e agora, o que fazer?

Tempo de leitura: 6 minutos

06 de maio de 2013 – ano I – nº 2 do Boletim Online

Alexandre Sérgio da Costa Braga – Presidente do Comitê de Infectologia da SMP, Membro do Grupo de Infectologia Pediátrica do Hospital das Clínicas – UFMG, Mestre Saúde da Criança e do Adolescente – UFMG, Coordenador do Serviço de Controle de Infecção Hospitalar do Hospital da Polícia Militar MG, Membro da Comissão de Controle de Infecção de Unidades de Urgência – PBH

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Panorama

Infelizmente aconteceu o que se previa, ou seja, um grande número de casos de dengue em Belo Horizonte e outros municípios.

Para termos uma idéia do problema, em todo ano de 2012 foram registrados 560 casos de dengue na capital e agora, em 2013, até meados de março, temos 4.215 casos1.

Outras cidades de Minas Gerais apresentam situação tão ou mais preocupante, sendo registrado até o momento 28 óbitos no estado2.

Como as estratégias para se evitar a epidemia não surtiram o efeito esperado, a consequência imediata foi um brusco aumento dos atendimentos nas unidades de urgência, colocando os profissionais da linha de frente numa situação ainda mais crítica que a habitual.

Em poucos minutos algumas questões devem ser definidas: trata-se realmente de um caso de dengue? Há possibilidade de evolução desfavorável? Como realizar a abordagem terapêutica?

Diagnóstico

Normalmente, nos casos de dengue, espera-se que o paciente apresente febre com duração menor que sete dias e pelo menos dois dos seguintes sintomas/sinais: cefaléia, dor retro-orbitária, mialgia, artralgia, prostração e exantema, este normalmente maculo-papular podendo ser pruriginoso e não responsivo à terapêutica com anti-histamínicos. Exceto pela dor retro-orbitária, que tem certa especificidade, as outras manifestações podem ser atribuídas a qualquer vírus (Ex. rubéola, sarampo), ou mesmo a algumas infecções bacterianas (Ex. febre maculosa, malária, escarlatina, meningococcemia).

Para dificultar ainda mais o diagnóstico clínico, tem sido aventada a possibilidade de casos de dengue sem febre, no entanto, segundo o Dr. Eric Torres, a febre sempre está presente, porém a mesma pode ser de baixa intensidade, assim como fugaz, com duração de apenas poucas horas3.

Em relação aos exames complementares tem-se o hemograma que pode revelar alterações como leucopenia, plaquetopenia e hemoconcentração, os dois últimos, com possíveis correlações com gravidade, ou seja, plaquetas abaixo de 50.000/mm3 e hematócrito acima de 10% do valor basal4.

O teste rápido, que detecta um antígeno viral (NS1), com resultado disponível em 30 minutos, sem dúvida foi um grande avanço, apresenta sensibilidade de 73,5-86,5% e especificidade de 98,5%5, podendo ser solicitado a partir de 24h do início das manifestações clínicas até o quarto dia.

Os anticorpos do tipo IgM, que tem boa sensibilidade (96,4%) e especificidade (98,9%)6, são detectados através da sorologia após o quinto dia dos sintomas, no entanto, o resultado pode demorar dias para ser disponibilizado, auxiliando pouco naqueles pacientes com evolução mais grave.

O isolamento viral, apesar de pouco disponível, pode ser requerido até o quarto dia do início dos sintomas, auxiliando no diagnóstico dos casos mais agudos e graves, de maneira semelhante ao teste rápido.

Alguns grupos pediátricos merecem maior atenção, pois têm possibilidade de evoluírem desfavoravelmente. Destacam-se as adolescentes grávidas, crianças menores de 13 anos, pacientes que possuem comorbidades como: diabetes, asma, doenças hematológicas, nefropatas, hepatopatas, usuários de anti-coagulantes ou anti-agregante plaquetário, imunossupressores e anti-inflamatórios.

Sinais e sintomas de alarme podem ser detectados na anamnese ou posteriormente no exame físico. Destacam-se dor abdominal intensa e contínua, vômitos persistentes, sangramentos, hipotensão postural, hepatomegalia dolorosa, derrames cavitários, desconforto respiratório, hipotermia, redução da diurese, sonolência ou irritabilidade.

Serão considerados graves aqueles pacientes que manifestarem sinais de choque (hipotensão arterial, extremidades frias e cianóticas, pulsos rápidos e finos, enchimento capilar lentificado).

A terapêutica varia de acordo com a gravidade do quadro clínico, este definirá onde o paciente receberá os cuidados, quais exames deverão ser solicitados e a forma de se conduzir a hidratação e demais medidas de suporte (Quadro 1).

Paracetamol e dipirona são os antitérmicos de eleição, estando proscritos os salicilatos, anti-inflamatórios não-esteróides (inclusive o ibuprofeno) ou corticóides.

Orientar aos responsáveis ou pacientes que casos graves podem ocorrer justamente após o período da defervescência.

Aqueles que necessitaram de internação terão sua alta condicionada a melhora importante do quadro clínico (com ênfase na estabilidade hemodinâmica), hematócrito normal ou estável, plaquetas normais ou acima de 50.000/mm3 e preferencialmente ausência de derrames cavitários, estes se presentes devem estar em regressão ou não causarem repercussão clínica.

Classificação dos casos de dengue

Então, o que fazer? Em relação aos aspectos médicos, apesar da complexidade de alguns casos, temos diretrizes relativamente bem estabelecidas que nos auxiliam na tomada de decisões.

Do outro lado, quando avaliamos os aspectos epidemiológicos, observamos um cenário crítico e desanimador, pois, enquanto comunidade, falhamos na implantação das medidas que poderiam impedir a disseminação do Aedes aegypti, apesar da exaustiva propagação da informação pelos vários meios de comunicação.

O que esperar ? Quem sabe um dia uma vacina eficaz para não presenciarmos outras epidemias!

Quadro 1 – Manifestações clínicas e laboratoriais para classificação dos casos de dengue e condutas:

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*Ht – Hematócrito.

** A cargo do médico assistente – Exemplo: AST, ALT, bilirrubinas, albumina, coagulação (AP/RNI, PTT), glicemia, eletrólitos, uréia, creatinina. Se suspeita de derrames cavitários solicitar Rx de tórax e/ou ultrassom toraco-abdominal.

Referências bibliográficas

1 – Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte. Combate a dengue 2012 e 2013. Disponível em: http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/comunidade

2 – Secretaria Estadual de Saúde de Minas Gerais. Situação atual da dengue em Minas Gerais Resumo informativo – 21/03/2013

Disponível em: http://www.saude.mg.gov.br/publicacoes/estatistica-e-informacao-em-saude/boletim-semanal-dengue/marco-2013/Analise%20%20Dengue%2021-03-13.pdf

3 – Torres EM. Dengue y Dengue Hemorrágico. Editorial de la Universidad Nacional de Quilmes, 1998.

4 – Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte. Protocolo de Atendimento dos Pacientes com suspeita de Dengue, 2013. Disponível em: Manuais e Protocolos:

http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/comunidade.do?evento=portlet&pIdPlc=ecpTaxonomiaMenuPortal&app=saude&tax=16010&lang=pt_BR&pg=5571&taxp=0&

5 –Chaterji S et al. Evaluation of the NS1 Rapid Test and the WHO Dengue Classification Schemes for Use as Bedside Diagnosis of Acute Dengue Fever in Adults. Am J Trop Med Hyg, 84(2), 2011, pp. 224–228

6 – Blacksell SD et al. Comparison of Seven Commercial Antigen and Antibody Enzyme-Linked Immunosorbent Assays for Detection of Acute Dengue Infection. Clin Vaccine Immuno 2012, 19(5):804-10

7 – Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância em Saúde. Dengue: diagnóstico e manejo clínico: criança, 2011. Disponível em: http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/web_dengue_crian_25_01.pdf

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